No Diário de Notícias de 26/01/2008: "Com a publicação, no dia 10 deste mês, do decreto regulamentar 2/2008, ficou instituída a avaliação de desempenho consagrada no novo Estatuto da Carreira Docente (ECD), aprovado há um ano. A reforma, defendida pela tutela como fundamental para "valorizar" o trabalho individual dos professores, promete influenciar profundamente o percurso profissional dos educadores.
A avaliação, bienal, assentará numa grelha de classificação que vai do insuficiente ao excelente. E ao contrário do que sucedia no anterior modelo, em que praticamente a totalidade dos professores progredia ao mesmo ritmo, as notas serão mesmo fundamentais para decidir quem sobe, quem estagna e quem arrisca mesmo ser expulso da carreira. Quem for "muito bom" ou "excelente", uma classificação sujeita a uma quota máxima de 20% dos avaliados, vai subir mais rapidamente. Quem ficar abaixo do "bom", correspondente a uma média de 6,5 a 7,9 valores numa escala de 10, não progride. Quem repetir duas ou mais classificações insuficientes fica sujeito a procedimentos que poderão conduzir mesmo à sua expulsão da rede do Ministério da Educação.
Nuno Crato, professor universitário e presidente da Sociedade Portuguesa de Matemática (SPM), é assumidamente um defensor de uma cultura de avaliação no sistema educativo português. E, como não poderia deixar de ser, acredita que os docentes não podem ficar de fora desse esforço: "A avaliação dos professores é necessária. E são bem-vindos todos os esforços para que esta seja feita de forma mais frequente e sistemática."
É justo que se estabeleçam quotas para as melhores notas?
O estabelecimento de quotas para as melhores classificações, eliminando, na prática, a possibilidade de todos poderem almejar à excelência, tem sido um dos aspectos da reforma mais criticados pelos sindicatos do sector. É uma regra, dizem, que serve objec- tivos"economicistas", permitindo controlar os aumentos salariais. Nuno Crato reconhece que o princípio das quotas "tem algo de perverso", mas, diz, "tem algumas vantagens óbvias. Sabemos que a ausência de quotas leva a que toda a gente tenha muito bom".
Os aspectos e a forma de avaliação são os melhores e mais rigorosos para traduzir a realidade?
A avaliação dos professores terá várias etapas. A primeira componente é a auto-avaliação (obrigatória), em que o profissional analisa o cumprimento dos objectivos a que se propôs no início do ano lectivo e descreve o enriquecimento profissional que conseguiu, nomeadamente através de acções de formação. O docente é também avaliado pelo coordenador, por necessidade um professor que já chegou à categoria de titular, preferencialmente da mesma área de docência. Este coordenador vai analisar aspectos como o planeamento das actividades lectivas, o trabalho em sala de aula (tem de assistir a pelo menos duas aulas por ano), a relação com os estudantes e os progressos por estes obtidos. Numa terceira fase entra a direcção executiva da escola, ponderando aspectos qualitativos como a assiduidade, o serviço distribuído ao professor e também os progressos dos alunos e redução do abandono escolar dos mesmos, a participação em actividades da escola e do grupo de docência.
Para o presidente da SPM, é sobretudo ao nível da associação dos progressos dos estudantes ao mérito do professor que o diploma merece maiores reservas. "Se os resultados e notas dos alunos vão ser uma parte da avaliação, parece haver uma pressão para que o professor suba as notas. Se isso acontecer, em vez de se melhorar o sistema de ensino vamos estar a piorá-lo. Sabemos que de há uns 10 anos para cá houve uma grande pressão para que os professores recusassem a retenção dos alunos e não se pode dizer que as consequências tenham sido positivas", explica.
Em causa, garante Nuno Crato, não está a relevância da análise do desempenho dos estudantes. Bem pelo contrário. Esse deveria ser o referencial mais importante. Mas para isso é preciso avaliar com outro rigor: "A falha essencial do nosso sistema educativo é este não exigir uma avaliação externa sistemática dos alunos. Em todo o ensino básico, só temos provas de aferição no 9.º ano, e mesmo estas só reflectem duas disciplinas [Português e Matemática], contando 30% para a nota. As provas de aferição [4.º e 6.º anos] pouco ou nada dizem e nem sequer conhecemos os critérios para a sua classificação. Mesmo no secundário, os critérios estão sempre a mudar. Por isso, não temos como dizer se um aluno que acabou o 12.º este ano lectivo está melhor ou pior preparado do que quem o acabou há 10 anos".
A associação dos resultados dos alunos à classificação do docente terá em conta o ponto de partida dos alunos, bem como o seu enquadramento sócio-económico. Mas, para Nuno Crato, essa contextualização não chega para garantir indicadores fidedignos. "Se tivessemos a certeza de que as notas que o aluno obteve no ano anterior correspondem ao que este sabe, o contexto sócio-económico não seria relevante. Se teve 10 e passou para 11, melhorou. Se baixou do 16 para o 15 piorou.
Existem condições objectivas para que a avaliação reflicta já o ano lectivo em curso?
O Ministério da Educação pretende que o ano lectivo de 2007/08 seja já considerado na avaliação dos professores. Porém, à parte os constrangimentos inerentes a uma avaliação que começa em pleno segundo período, têm surgido outros obstáculos. O regulamento dava 20 dias úteis às escolas para adoptarem os instrumentos de medida que servirão para avaliar os professores. Mas o conselho científico que deveria produzir recomendações sobre esses instrumentos ainda não existe. Será a sua presidente a fazê-las. E as fichas de avaliação dos professores também se atrasaram, acabando aprovadas, sem negociação, por despacho da ministra. Nuno Crato lamenta o "óbvio" impacto negativo que isso tem, e critica a "pressa" do Governo em legislar. "Aconteceu o mesmo com a avaliação dos manuais e acabaram, anos depois, por alterar o projecto para obter uma lei mais ponderada equilibrada"."
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A avaliação, bienal, assentará numa grelha de classificação que vai do insuficiente ao excelente. E ao contrário do que sucedia no anterior modelo, em que praticamente a totalidade dos professores progredia ao mesmo ritmo, as notas serão mesmo fundamentais para decidir quem sobe, quem estagna e quem arrisca mesmo ser expulso da carreira. Quem for "muito bom" ou "excelente", uma classificação sujeita a uma quota máxima de 20% dos avaliados, vai subir mais rapidamente. Quem ficar abaixo do "bom", correspondente a uma média de 6,5 a 7,9 valores numa escala de 10, não progride. Quem repetir duas ou mais classificações insuficientes fica sujeito a procedimentos que poderão conduzir mesmo à sua expulsão da rede do Ministério da Educação.
Nuno Crato, professor universitário e presidente da Sociedade Portuguesa de Matemática (SPM), é assumidamente um defensor de uma cultura de avaliação no sistema educativo português. E, como não poderia deixar de ser, acredita que os docentes não podem ficar de fora desse esforço: "A avaliação dos professores é necessária. E são bem-vindos todos os esforços para que esta seja feita de forma mais frequente e sistemática."
É justo que se estabeleçam quotas para as melhores notas?
O estabelecimento de quotas para as melhores classificações, eliminando, na prática, a possibilidade de todos poderem almejar à excelência, tem sido um dos aspectos da reforma mais criticados pelos sindicatos do sector. É uma regra, dizem, que serve objec- tivos"economicistas", permitindo controlar os aumentos salariais. Nuno Crato reconhece que o princípio das quotas "tem algo de perverso", mas, diz, "tem algumas vantagens óbvias. Sabemos que a ausência de quotas leva a que toda a gente tenha muito bom".
Os aspectos e a forma de avaliação são os melhores e mais rigorosos para traduzir a realidade?
A avaliação dos professores terá várias etapas. A primeira componente é a auto-avaliação (obrigatória), em que o profissional analisa o cumprimento dos objectivos a que se propôs no início do ano lectivo e descreve o enriquecimento profissional que conseguiu, nomeadamente através de acções de formação. O docente é também avaliado pelo coordenador, por necessidade um professor que já chegou à categoria de titular, preferencialmente da mesma área de docência. Este coordenador vai analisar aspectos como o planeamento das actividades lectivas, o trabalho em sala de aula (tem de assistir a pelo menos duas aulas por ano), a relação com os estudantes e os progressos por estes obtidos. Numa terceira fase entra a direcção executiva da escola, ponderando aspectos qualitativos como a assiduidade, o serviço distribuído ao professor e também os progressos dos alunos e redução do abandono escolar dos mesmos, a participação em actividades da escola e do grupo de docência.
Para o presidente da SPM, é sobretudo ao nível da associação dos progressos dos estudantes ao mérito do professor que o diploma merece maiores reservas. "Se os resultados e notas dos alunos vão ser uma parte da avaliação, parece haver uma pressão para que o professor suba as notas. Se isso acontecer, em vez de se melhorar o sistema de ensino vamos estar a piorá-lo. Sabemos que de há uns 10 anos para cá houve uma grande pressão para que os professores recusassem a retenção dos alunos e não se pode dizer que as consequências tenham sido positivas", explica.
Em causa, garante Nuno Crato, não está a relevância da análise do desempenho dos estudantes. Bem pelo contrário. Esse deveria ser o referencial mais importante. Mas para isso é preciso avaliar com outro rigor: "A falha essencial do nosso sistema educativo é este não exigir uma avaliação externa sistemática dos alunos. Em todo o ensino básico, só temos provas de aferição no 9.º ano, e mesmo estas só reflectem duas disciplinas [Português e Matemática], contando 30% para a nota. As provas de aferição [4.º e 6.º anos] pouco ou nada dizem e nem sequer conhecemos os critérios para a sua classificação. Mesmo no secundário, os critérios estão sempre a mudar. Por isso, não temos como dizer se um aluno que acabou o 12.º este ano lectivo está melhor ou pior preparado do que quem o acabou há 10 anos".
A associação dos resultados dos alunos à classificação do docente terá em conta o ponto de partida dos alunos, bem como o seu enquadramento sócio-económico. Mas, para Nuno Crato, essa contextualização não chega para garantir indicadores fidedignos. "Se tivessemos a certeza de que as notas que o aluno obteve no ano anterior correspondem ao que este sabe, o contexto sócio-económico não seria relevante. Se teve 10 e passou para 11, melhorou. Se baixou do 16 para o 15 piorou.
Existem condições objectivas para que a avaliação reflicta já o ano lectivo em curso?
O Ministério da Educação pretende que o ano lectivo de 2007/08 seja já considerado na avaliação dos professores. Porém, à parte os constrangimentos inerentes a uma avaliação que começa em pleno segundo período, têm surgido outros obstáculos. O regulamento dava 20 dias úteis às escolas para adoptarem os instrumentos de medida que servirão para avaliar os professores. Mas o conselho científico que deveria produzir recomendações sobre esses instrumentos ainda não existe. Será a sua presidente a fazê-las. E as fichas de avaliação dos professores também se atrasaram, acabando aprovadas, sem negociação, por despacho da ministra. Nuno Crato lamenta o "óbvio" impacto negativo que isso tem, e critica a "pressa" do Governo em legislar. "Aconteceu o mesmo com a avaliação dos manuais e acabaram, anos depois, por alterar o projecto para obter uma lei mais ponderada equilibrada"."
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