segunda-feira, 27 de abril de 2009

Consequências da não entrega da FAA.

Foi necessário o alerta de um amigo ("Advogado do Diabo"), para concluir que talvez estivesse a ser pouco claro nos posts, onde refiro a não entrega da ficha de auto-avaliação. Este post é um «rebate de consciência». Posso mesmo ter passado um ideia completamente errada. Por esse motivo, peço desculpa. Vou tentar corrigir esse erro da melhor maneira que sei, ou seja, escrevendo.

Para começar, quero que fique claro que discordo da não entrega da ficha de auto-avaliação (FAA). Pelo contrário, acho que se procederem dessa forma estarão a rumar para uma enorme encruzilhada de alternativas bem «negras». As críticas que fiz em posts anteriores, visavam outro objectivo, que não o de incentivar os colegas a procederem de forma ilegal (ou seja, não entregando a FAA).

Assim, quero salientar que considerei na altura, o incentivo de alguns sindicatos à não entrega dos Objectivos Individuais (OI), como um erro estratégico (por promover a divisão dos professores). E por uma mera questão de coerência estratégica, tal como não deveriam ter apelado à não entrega dos OI, não deveriam apelar agora (e como consequência) à entrega da Ficha de Auto-Avaliação (por promover o sentimento de «traição» e o acréscimo da desmobilização). Os sindicatos, não se deviam ter metido nesta «alhada». Agora, o que eu não posso, em consciência, é deixar que o raciocínio fique por aqui. Não se trata de defender os sindicatos, mas sim repor alguma justiça para com os mesmos.

É importante que os colegas conheçam em profundidade as consequências da não entrega da FAA. Provavelmente assim, não serão feitas críticas ocas aos sindicatos que alertam para a entrega dos FAA. Erraram na estratégia, é verdade, mas também não têm como objectivo prejudicar quem quer que seja.

Mas vamos às consequências, partindo de uma linha de raciocínio que me parece lógica:

Os colegas que não entregaram os seus Objectivos Individuais, foram certamente alvo de notificação, por parte dos respectivos CE´s. Também será lógico partir do princípio, de que terão reclamado da mesma.

Se entregaram uma reclamação da notificação, deixaram de forma implícita a ideia de que pretendiam avaliados mas não por este modelo, alertaram para uma ilegalidade (a que constava na notificação), no entanto, agiram dentro da legalidade (uma vez que não existe nada que obrigue à entrega dos OI). Este é o «ponto-chave» de toda a acção. Se não pretendiam entregar a FAA e como tal, rejeitar este modelo de avaliação de forma explícita e sem «olhar» a consequências, não deveriam ter respondido à notificação.

Agora, chega a fase da entrega da Ficha de Auto-Avaliação (FAA). Não a querem entregar? Pois... Vejamos as consequências.

Se não entregarem a mesma, para além das consequências previstas no ECD, incorrerão também numa pena de suspensão (colegas dos quadros) ou de despedimento (eventualmente para os colegas contratados). É necessário ponderar com extrema calma estes factos e não nos deixarmos arrastar por «mentes brilhantes».

A entrega dos OI não era obrigatória. A entrega da FAA é!

Recordemos então o que consta no Estatuto da Carreira Docente (artigo 44.º):

Depois, as consequências (artigo 41.º):

Mas não nos fiquemos por aqui. Os professores não têm que conhecer apenas o ECD, também tem de conhecer o Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores Que Exercem Funções Públicas. Não se esqueçam que somos funcionários públicos. Vamos ao Estatuto Disciplinar (artigo 17.º):

A pena de suspensão é aplicável aos trabalhadores que actuem com grave negligência ou com grave desinteresse pelo cumprimento dos deveres funcionais e àqueles cujos comportamentos atentem gravemente contra a dignidade e o prestígio da função, nomeadamente quando:

No entanto, a «coisa» ainda piora (artigo 18.º do mesmo Estatuto):

As penas de demissão e de despedimento por facto imputável ao trabalhador são aplicáveis em caso de infracção que inviabilize a manutenção da relação funcional, nomeadamente aos trabalhadores que:

De salientar ainda que, cruzando o novo regime de autonomia com o Estatuto Disciplinar (artigo 14.º), teremos o seguinte: A aplicação das penas “suspensão” e “demissão” são da competência do dirigente máximo do órgão ou serviço, no nosso caso, o «excelentíssimo» director. Como tal, lá se vai o argumento do “processos disciplinares implementados a milhares de professores, pelo ME, é impossível”. Pois seria… No entanto, com a figura do Director os procedimentos disciplinares e respectivos efeitos (penas) serão concretizados escola a escola e de forma «personalizada». Percebem agora porque deverão proceder ao preenchimento da FAA? É que se os sindicatos não foram estrategicamente inteligentes, se vocês não entregarem a FAA, estarão:

1 – A ser incoerentes com o que «afirmaram» (implicitamente) na reclamação à notificação do vosso CE, ou seja, queriam ser avaliados (embora não por este modelo), no entanto, não seriam obrigados a cumprir com o que não constava na lei (utilizaram ou não o ECD, para argumentar?);
2 - Estarão a sair da legalidade (basicamente a «saltar fora» do ECD), e como tal;
3 – A colocarem-se «a jeito» para uma penalização bem maior que as enumeradas no ECD.

Depois de isto tudo, ficam as questões:

a) Será que os sindicatos deverão continuar eternamente a ser criticados pelo facto de apelarem à entrega da FAA?
b) Estarão os colegas (que não entregaram os OI) dispostos a não entregar a FAA?

São as questões que vocês de devem colocar. Pensem com a vossa cabeça, e não com a cabeça dos outros. Ainda há muito tempo para chegarem à vossa resposta.

9 comentários:

  1. Estou globalmente de acordo. O que me merece reparo é a questão do erro estratégico, como procurei explicar em comentário anterior. Abraço.

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  2. Parabéns, Ricardo, por este trabalho tão minucioso e atento!
    Obrigada!

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  3. Finalmente, no meio de tanto disparate se lê um discurso bem feito e sensato.

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  4. Para Miguel Pinto: Já respondi ao teu comentário anterior (quando puderes dá uma «vista de olhos»). Discordamos do «erro estratégico», mas no fundamental estamos de acordo. Abraço para ti também...

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  5. O trabalho foi minuncioso, mas tenho de reconhecer que sem a grande ajuda do "Advogado do Diabo" seria bastante complicado fazê-lo.

    Quanto ao discurso: Tentei repôr um pouco de verdade sobre as «atitudes» dos sindicatos. Não é saudável continuarmos a criticar sem compreendermos os fundamentos.

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  6. Não praticar ou acto relativo à avaliação do desempenho não é violar um procedimento.

    por vezes há uma certa dificuldade em ler o que está escrito. Ou em interpretá-lo.

    Não estou a ser preciosista, apenas acho que a leitura feita neste post da legislação é equivalente à de um advogado do ME.

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  7. Olá, colega Guinote.

    Em primeiro lugar, agradeço a «chamada de atenção». Em segundo lugar, pondero sempre com muita calma as «correcções» que sejam feitas por colegas. Aliás, o «teor» assertivo, deixou-me com dúvidas quanto à minha «leitura da legislação» e às dificuldades que lhe estão inerentes. Como não concretizou a expressão “não praticar acto relativo à avaliação do desempenho não é violar um procedimento”, permanecem as dúvidas quanto ao fundamento. Gostaria que argumentasse ou justificasse o que afirmou, de preferência, recorrendo a um post no seu blogue. Esclareceria muito boa gente (incluindo eu). Adiante, que não é isso que interessa nesta «resposta».

    Vamos à minha interpretação:

    O conceito “violação de procedimento”, quando utilizado de forma genérica acaba por ser tão relativo, que será complicado argumentar consigo. No entanto, e correndo o risco de errar, proponho-lhe um exercício mais concreto e menos sujeito a ambiguidades. Fá-lo-emos juntos, se quiser e tiver tempo. Agradeço eventuais correcções ou divergências de opinião.

    Considerando o dever específico “Desenvolver a reflexão sobre a sua prática pedagógica, proceder à auto-avaliação e participar nas actividades de avaliação da escola”: Se não procedermos à auto-avaliação, estaremos a violar um procedimento ou estaremos apenas a violar um acto, que faz parte de um procedimento (o da avaliação do desempenho)? Se optarmos por esta última opção, e sabendo nós que o procedimento inclui seis «actos» (uma verdadeira peça de teatro, é o que isto é), quantos dependem directa ou indirectamente de nós, professores avaliados? Bem, não tive muito tempo para confirmar, mas parece-me que apenas 2:

    (1) Preenchimento pelo avaliado de uma ficha de auto-avaliação sobre os objectivos alcançados na sua prática profissional, na qual identificará a formação contínua
    realizada; e (2) Entrevista dos avaliadores com o avaliado para conhecimento da proposta de avaliação e apreciação do processo, em particular da ficha de auto-avaliação.

    Será que só quando não cumprirmos ambos os «actos» acima referidos, é que estaremos a violar um procedimento? Ou bastará o primeiro, para que o procedimento seja posto em causa? A partir de quando é que poderá ser constituído procedimento por pretensa violação do dever de «auto-avaliação»? Gostava que me respondesse a estas questões de forma clara (e se possível, argumentando com legislação), não por pura «mesquinhez» ou «preciosismo» (da minha parte), mas sim porque são esclarecimentos importantes para quem, a esta altura, se encontra indeciso quanto à entrega da FAA.

    Relativamente à expressão “a leitura feita neste post da legislação é equivalente à de um advogado do ME.”, fica aqui uma resposta:

    Lendo o parecer de Garcia Pereira (Capítulo XIII), pode ler-se o seguinte: “Não existe de todo qualquer normativo com natureza de acto legislativo que estabeleça o dever da entrega, pelo professor, dos seus objectivos individuais, sendo certo que a única obrigação legalmente estabelecida é, nos termos do artº 44º, nº 1, al. c) do ECD, a do preenchimento e, pressupõe-se, a entrega da chamada “ficha de auto-avaliação” sobre os objectivos alcançados na sua prática profissional, nada se estipulando no sentido de que os ditos objectivos tenham de ser propostos ou até fixados pelo próprio professor.”

    Não terei eu concluído o mesmo? A interpretação dada por mim, relativamente às consequências, até poderá estar menos correcta ou ser menos agradável de ler, mas terá sido assim tão má para ser sujeito a comparações com advogados do ME?
    Continue com o bom trabalho, colega Guinote. Aquilo que escreve e as iniciativas que promove têm-se revelado bastante úteis. Não encare este post como algo pró-ministerial ou pró-sindical (apetecia-me utilizar aqui uma piada fácil, mas não a vou fazer).

    Era importante (não sei se para mais alguém, mas para mim, era) que esclarecesse quais as consequências da não entrega da FAA ou em que moldes a «não participação» passa a violação. Mesmo muito importante…

    Por último, não pretendo desmobilizar quem quer que seja para a nossa luta. Prefiro isso sim, que quem nela esteja, esteja de corpo e alma, informado quanto às eventuais consequências e que no final não aponte dedos para outros, na eventualidade de algo dar para o «torto».
    Cumprimentos.

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  8. Ricardo, obrigada pela análise criteriosa.
    Não duvido da questão da legalidade. Li o ECD e o Parecer do Garcia Pereira. Desde que saiu o parecer que me interrogo sobre o que fazer na fase da entrega da FAA.
    Mas, sejamos todos honestos, que luta é a nossa? Como se pode lutar contra decisões superiores fundamentadas em leis? Fazendo manifestações de rua e "cumprindo" no terreno?
    Esta questão foi camuflada ou esquecida desde o início.
    Os sindicatos apelaram à não entrega dos OI.
    (Eu nem notificada fui.)
    Nessa altura, teria sido mais correcto afirmar que não se entregavam OI mas se entregaria a FAA.

    Dou por mim a pensar se o Parecer do Garcia Pereira apenas serviu para lutar contra a ilegalidade da fase dos Objectivos!
    É que isso aparece numa Adenda. Todo o resto do parecer aponta as ilegalidades do ECD!
    aBRAÇO.

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  9. Como eu te compreendo, reb. Na realidade, que luta é esta, que por mais que façamos resulta em nada ou praticamente nada?! Tão desnorteados andamos, que só ponderamos esmorecer ou radicalizar. Sinto-me assim e acho que tu também.

    Os OI e a FAA nunca deveriam ter sido «rumo» para os sindicatos. Foi um erro de todo o tamanho, em várias vertentes.

    Quanto à tua questão: "Como se pode lutar contra decisões superiores fundamentadas em leis?" Na realidade, é complicado. É importante que os colegas conheçam toda a legislação, para saberem exactamente onde e quando actuar. Não te posso dizer que é impossível. A frente jurídica é extremamente importante, irá ajudar, mas não será solução a curto prazo.

    As manifestações poderão ser uma solução, mas já andamos um pouco cansados disso, não é? Pelo menos eu ando. O que nos resta? Bem...

    Greves de vários dias? Não terão a adesão pretendida, mas seria sem dúvida, uma iniciativa de impacto esmagador.

    Greve de um dia? Provavelmente não terá a adesão pretendida. Muita gente já desmobilizou, muito por culpa de iniciativas anteriores.

    Greve de zelo? Se calhar... Mas será necessário extremo cuidado com os moldes em que será feita.

    Votar em outro partido ou em branco, nas eleições legislativas? Pode dar resultado, mas nada nos garante que o rumo no sistema educativo seja alterado.

    Podemos explorar melhor as alternativas de luta. Pode ser que cheguemos ambos a uma conclusão. Pode ser que cheguemos ambos a uma sugestão que reúna consenso e a uma adesão maior por parte dos professores.

    Tenho passado estas últimas semanas, a estudar legislação para ver se consigo encontrar «brechas» legais ou alternativas de luta, no entanto, ainda nada me ocorreu. Infelizmente...

    O que não podemos fazer, é baixar os braços. Acho que cada um, à sua maneira, pode contribuir. Só pelo facto de alguém perder tempo a pensar em alternativas (ou mesmo a ouvir e ponderar as dos outros), para mim, é sinal que ainda não desistiu.

    Espero que não desistas...

    Abraço.

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